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Foto do escritorMark Mullen

O Jiu-Jitsu na Terra do Sol Nascente



Esta semana, apresentamos à nossa comunidade global da GB o professor Ryo Ominami, faixa-preta de 4º grau do Mestre Carlos Gracie Jr. e fundador da GB Tokushima no Japão.


O Professor Ryo nos contou sobre como decidiu viajar ao Brasil para treinar Jiu-Jitsu bem no início da Gracie Barra, a influência de seus mentores, o crescimento do Jiu-Jitsu da GB no Japão, o papel do Jiu-Jitsu na superação de sua timidez e como ele vê as diferenças entre o Jiu-Jitsu no Japão e no Brasil


Em 2022, Ryo Ominami viajou para Florianópolis, no Brasil, para participar da Cúpula Mundial, onde recebeu seu 4º grau na faixa-preta das mãos do Mestre Carlos Gracie Jr.


“Tenho muito orgulho por alcançar o 4º grau, mas, ao mesmo tempo, ainda sou muito modesto quanto a isso. Eu estava ao lado de muitos professores da GB, como o Márcio, Flávio, Escorrega e Piu Piu. Então, diante deles, ainda me sinto um faixa-azul”, ri o Professor Ryo.


Ryo começou no Jiu-Jitsu por volta dos 14 anos, após ver alguns vídeos das primeiras edições do UFC na casa de um amigo, 26 anos atrás. Na época, praticamente não havia academias de Jiu-Jitsu no Japão. Ao buscar na internet, o jovem Ryo encontrou uma escola recém-inaugurada e decidiu se matricular imediatamente naquela unidade. Era a GB de Shikoku.


Seu primeiro instrutor foi o Professor Hidenori Hayashi, um faixa-roxa que dava aulas em Shikoku. Ele foi aluno do Professor Aroldo Kobayashi, instrutor nipo-brasileiro, sob a orientação do Mestre Carlos Liberi.


“Segui treinando até a faixa-azul. Quando a alcancei, em 2004, fui para o Brasil. Eu era jovem e muito curioso. Queria aprender com os melhores. Naquela época, o BJJ não era tão profissional no Japão quanto é hoje”, explica o Professor Ryo.


“Nós aplicávamos armlocks e estrangulamentos um no outro... Parecia Jiu-Jitsu, mas não era real”, relembra, rindo. “Então, eu queria aprender com os melhores dos melhores”.


Pode até ser difícil para os alunos de hoje entender como as informações sobre o Jiu-Jitsu eram limitadas naquela época. A comunidade do BJJ não era tão desenvolvida na internet, e o acesso às instruções técnicas, como temos hoje com a GB Online, era bem limitado. Nos primórdios da expansão global do Jiu-Jitsu, boa parte dos ensinamentos técnicos tinham que ser passados pessoalmente em seminários ou, como fez o Professor Ryo, viajando até o Brasil.


Viagem para treinar no Brasil

O Professor Ryo fez uma verdadeira peregrinação até a escola original da GB na Barra da Tijuca, no Rio de Janeiro.


“Foi uma experiência incrível! Até aquele momento, eu nunca tinha visto um faixa-preta e, então, na sede da GB, no Rio de Janeiro, havia uns 50 no mesmo dia e no mesmo tatame. O Mestre Carlos estava lá, o Professor Márcio Feitosa, o Professor Fábio e o Piu Piu. Até o Roger Gracie. Todos treinando no mesmo tatame. Era um ambiente inacreditável”, relembra o Professor Ryo.


“Eu me sentia como um jovem japonês fissurado em beisebol entrando no estádio dos Yankees!”


Nessa primeira viagem, o Professor Ryo ficou três meses no Brasil até retornar ao Japão. Aquilo aguçou o apetite por treinar direto na fonte. Então, ele juntou suas economias do trabalho na área de construção para voltar ao Brasil no ano seguinte, em 2005, e ficar por dez meses mergulhado no mundo do Jiu-Jitsu.


O Jiu-Jitsu não está só no tatame. É um estilo de vida.

Questionado sobre como a experiência de viajar para o outro lado do mundo influenciou sua filosofia no Jiu-Jitsu, ele responde: “O que pude sentir com a minha experiência no Brasil é que o Jiu-Jitsu não está só no tatame. Fora dele, as pessoas também se exercitam juntas, fazem caminhadas, surfam e se alimentam bem. Eu não sabia disso.”


E ele prossegue: “Antes de chegar ao Brasil, eu pensava que o Jiu-Jitsu era apenas uma questão de treino e técnica. Fazer seu sparring, participar de uma competição, etc... Mas, para os alunos da Gracie Barra, o Jiu-Jitsu não é só uma arte marcial. É um estilo de vida.”


As artes marciais tradicionais japonesas e o Jiu-Jitsu brasileiro

O Japão é a terra dos samurais e ostenta uma tradição milenar nas artes marciais. Além disso, é o berço do Jiu-Jitsu original. Mas o Professor Ryo vê uma diferença entre a prática das artes marciais tradicionais no Japão (judô, karatê, kendo) e a abordagem da GB.


“Eu diria que as artes marciais japonesas ficam mais restritas ao tatame e não saem dali. As pessoas se concentram mais na arte em si. Nas técnicas, na mecânica dos movimentos e em como superar seus adversários. Já o Jiu-Jitsu Brasileiro vai muito além disso.”


O Professor Ryo também revela algo surpreendente sobre a diferença de abordagem que ele enxerga no treinamento das artes marciais japonesas.


“Entre os japoneses, todos que treinam judô e karatê são muito rígidos no tatame. Mas, fora dele, as pessoas bebem, fumam, não se exercitam...”, explica o Professor. “É completamente diferente”.


Quando ainda era faixa-roxa no Jiu-Jitsu, o Professor Ryo estava focado principalmente em se tornar o melhor competidor possível. Inspirado por vários instrutores da GB que havia conhecido, como os Professores Márcio Feitosa, Carlos Lemos Jr. e Nao Takigawa do Japão, Ryo queria ser um verdadeiro campeão de Jiu-Jitsu.


Experiência nas competições

O Professor Ryo competiu na categoria Peso-pena Adulto no Japão, EUA e Brasil até os 30 anos.


Sua conquista de maior orgulho no profissional foi vencer três vezes o Aberto da Ásia da IBJJF. Suas vitórias ocorreram nas faixas roxa, marrom e, finalmente, na faixa-preta.


“No segundo Aberto da Ásia, quando venci na faixa-marrom, o Mestre Carlos Gracie Jr. estava no pódio e me promoveu à faixa-preta”, lembra o Professor Ryo. “Foi um momento muito especial.”



O Professor e Mentor Carlos Lemos Jr.

Em uma de suas viagens para treinar Jiu-Jitsu no Brasil, o professor Ryo teve a sorte de conhecer alguém que viria a ser fundamental em sua vida: o Professor da GB Carlos Lemos Jr.


“Enquanto estive no Brasil, fiquei na casa do Professor Carlos Lemos Jr.. Estive com ele 24 horas por dia, 7 dias por semana. Juntos o tempo todo. E ele me ensinou muitas, muitas coisas!” Um ano inteiro morando, treinando e se alimentando com o Professor Carlos Lemos impactou profundamente o envolvimento de Ryo com o Jiu-Jitsu.



Após alcançar a faixa-preta no Japão, Ryo foi convidado pelo Professor Carlos Lemos para viajar aos Estados Unidos e trabalhar como instrutor.


“Eu o ajudei a abrir uma nova escola da GB em Downers Grove”, conta Ryo. “Ele sempre foi meu mentor e meu melhor amigo. Sou abençoado por ter alguém como ele me orientando.”


Ao comentar sobre a maior influência da convivência com Carlos Lemos para o seu Jiu-Jitsu, Ryo responde de forma direta: “a Irmandade”.


“Desde o dia em que o conheci, ele sempre teve uma mente aberta. Além disso, quando estou em uma situação difícil, ele me ajuda 100%. Já enfrentei muitos momentos difíceis na minha vida, e ele sempre me ajudou. 100%.” Ryo nos conta que toda essa experiência o inspirou a seguir sua trajetória no Jiu-Jitsu.


“Ele sempre me motivou. Quando estou com preguiça, ele me incentiva com muita energia. Eu era muito tímido, um cara um pouco fechado. Ele me ajudou a mudar de muitas maneiras.”


Ensinando o Jiu-Jitsu da GB em Fukushima, Japão

Em 2006, Ryo passou a treinar com o Professor Nao Takigawa, da GB Kobe, no Japão, e o ajudou como instrutor assistente por cinco anos. Ele relembra esse período como uma época de muito aprendizado, onde teve a oportunidade de conhecer melhor as metodologias da Gracie Barra com o Professor Takigawa.


Mais tarde, Ryo se mudou para os EUA para treinar e trabalhar ao lado de seu antigo mentor, o Professor Carlos Lemos Jr., voltando posteriormente ao Japão para abrir uma escola da GB na cidade onde nasceu e cresceu: Tokushima.


“Eu queria contribuir para a minha comunidade, para a cidade onde cresci”, conta o Professor. “Aprendi muitas coisas com o Jiu-Jitsu e quero passar isso para a próxima geração.”


O Professor Ryo nos dá um exemplo específico de algo que aprendeu com o Jiu-Jitsu e que busca compartilhar com seus alunos na GB Tokushima.


“Minha cidade é mais rural, com uma população pequena. É uma sociedade mais fechada, culturalmente falando. Então, quero abrir essas portas para a próxima geração. O Jiu-Jitsu dá muitas chances e oportunidades, principalmente aos mais jovens.”


A ajuda do Jiu-Jitsu para vencer a timidez

Ryo Ominami nos conta que, quando mais jovem, era extremamente tímido e fechado. Hoje, ele tem muitos amigos pelo mundo, seja nos EUA, Brasil ou Europa.”


Para ele, o Jiu-Jitsu provou ser mais do que uma válvula de escape para suas ambições competitivas. Ryo sente que os treinamentos influenciaram profundamente sua personalidade e o ajudaram a desenvolver confiança para interagir com as pessoas e superar sua timidez. Ele aponta o tempo que passou treinando e convivendo com o Professor Carlos Lemos como uma profunda influência em seu desenvolvimento como instrutor de Jiu-Jitsu e para cultivar uma personalidade mais aberta.


O Professor Ryo vê o Jiu-Jitsu como um caminho para a próxima geração de jovens no Japão desenvolver suas personalidades e habilidades sociais para a vida.


As diferenças culturais do Jiu-Jitsu no Brasil e no Japão

O Jiu-Jitsu se originou no Japão e evoluiu no Brasil, em grande parte por meio dos esforços da lendária família Gracie. O Professor Ryo Ominami compartilhou sua percepção sobre o estilo do Jiu-Jitsu Brasileiro no Japão.


“Quando abri minha escola em 2013, não faz muito tempo, os japoneses já sabiam da eficácia do Jiu-Jitsu, por causa do MMA e do UFC. As pessoas já estavam mais cientes sobre o que era o Jiu-Jitsu. Mas, 20 anos atrás, era completamente diferente.”


No começo, professores e praticantes das artes marciais japonesas mais tradicionais ficaram desconfiados com esse novo estilo de Jiu-Jitsu que chegava do Brasil. Havia os mais céticos que o encaravam como uma expressão inferior do judô olímpico.


“Eles achavam que o Jiu-Jitsu não era nada. Que o judô, sim, era pra valer”, sorri o Professor Ryo. “Mas muitos praticantes de Jiu-Jitsu lutaram no MMA, no UFC, e ajudaram a mudar essa percepção. Hoje, as pessoas entendem o Jiu-Jitsu. Mesmo os antigos praticantes das artes marciais, os caras do karatê, do judô, respeitam o Jiu-Jitsu”, conta Ryo com um sorriso. “Foi testado e aprovado em batalha!”


A popularidade do Jiu-Jitsu Brasileiro no Japão

O Professor Ryo vê um declínio na popularidade das artes marciais tradicionais entre os jovens japoneses, ao passo que o Jiu-Jitsu está crescendo.


“O Jiu-Jitsu vem crescendo muito rápido. A população das artes marciais tradicionais está diminuindo um pouco no Japão”, diz ele.


“A federação de Jiu-Jitsu diz que hoje há trinta mil pessoas treinando BJJ no Japão. Existem mais de trezentas escolas em todo o país. Estamos crescendo”, conta o Professor. “A população de praticantes de judô no Japão é de duzentos mil. O Jiu-Jitsu está crescendo muito rápido e acredito que um dia será até maior que o judô.”


Existem alguns fatores que contribuem para esse declínio do judô. “Não é só por causa do Jiu-Jitsu. O judô também tem muitos problemas. Se você quer aprender judô no Japão, não encontra uma escola.” Mas por quê?


O judô tem amplo apoio como parte dos programas esportivos japoneses e é voltado para formar atletas para a seleção nacional. Não é uma modalidade pensada como algo recreativo, da qual diferentes tipos de pessoas possam participar.


O Jiu-Jitsu para Todos

“Como o judô japonês é pensado para as Olimpíadas, para os torneios e seus competidores, se quiser aprendê-lo, teria que voltar aos seus 6 anos de idade. Você precisa encontrar uma escola que ensine judô.” conta o Professor Ryo. “E se você não tem chances de se tornar um campeão, provavelmente terá que desistir. Ou seja, não é algo para pessoas comuns.”


“Você até pode aprender judô se for ao Kodokan (a sede da modalidade em Tóquio), mas não encontrará opções em todo lugar... O judô NÃO é para todos. Tem uma abordagem totalmente diferente. Então, o Jiu-Jitsu vai agregar mais pessoas.”


O Professor Ryo acredita que, graças à filosofia da GB de levar o Jiu-Jitsu para Todos, a modalidade seguirá ganhando popularidade e acabará ultrapassando o judô tradicional no Japão.


Ele comenta, sorrindo: “A visão do Mestre Carlos é muito inteligente. Ele tem algo... Consegue ver o futuro.”


A filosofia do Professor Ryo no Jiu-Jitsu e o futuro da GB no Japão

“Meu objetivo é mudar a vida das pessoas para melhor através do Jiu-Jitsu”, diz ele. “Hoje, nos tatames da escola de Jiu-Jitsu da GB, tecnicamente, todos estão em um nível muito bom. Os praticantes têm boas maneiras, são disciplinados e agem com muito respeito.”


“Mas fora do tatame...”, ele ri. “Ainda não há aquele estilo de vida no Jiu-Jitsu japonês. Então, preciso ser como o Professor Carlos foi para mim e liderar pelo exemplo. Estou sempre pensando nisso.”


“Assim, as pessoas poderão experimentar 100% do Jiu-Jitsu. Poderão aproveitá-lo 100%”, reforça o Professor Ryo. “Isso não se resume ao tatame. É um estilo de vida. Nos tatames, o JJ japonês está muito bom! Tem um bom futuro pela frente. Tudo está indo bem. Mas fora deles, quanto ao estilo de vida, ainda temos que melhorar mais. Fazer mais atividades, mais treinos...”


O Professor Ryo promove questões como uma alimentação melhor, hábitos saudáveis e treinamentos cruzados (para apoiar o desempenho físico no Jiu-Jitsu) como fatores externos à sua Escola GB e importantes para que os praticantes alcancem uma abordagem completa e possam usufruir de todo o estilo de vida do Jiu-Jitsu.


Blog escrito originalmente em inglês por Mark Mullen, faixa-preta da Gracie Barra


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